quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Primitivo

Tem tempos que eu não morro.
Antes, no início de minha vida de adulta, eu morria um pouco todos os dias. Iludia-me nas correntezas de deveres que me impunham. E nunca me era fácil resgatar as partículas que me iam com a velocidade das passagens, resgatá-las e voltar a ser inteira.
E mesmo o trabalho de reconstituição me levavam quilogramas de energia.
Então eu me desfazia, um pouco todos os dias.
Até que em um deles, depois de quase finda as idas perdidas. Quase: não sou dessas de ser Fênix.
No meu Quase eu refleti de onde vinha o meu sustento, a minha essência. A essência que tanto gritava louca à procura. Aquilo a que poderia recorrer quando me faltavam apenas algumas partículas por se diluir no emaranhado de águas e ventos poluídos que me envolviam.
Descobri o que me enchia de regozijo pela vida.
E foi daí então que minhas correntezas mudaram: permaneceram os deveres, mas deixei também que outras correntes me levassem sem levar, mas repor. Preenchendo-me e repondo partes perdidas. Lembrando-me de ser Uma.
Achei. Lá de onde vem o meu astro, o meu sol: a natureza.
Então disse a mim mesma: eu sou mulher do mato. Dessas primitivas (alguns definiriam) que se sensibiliza no que ainda é pequeno, sem poder se sufocar na civilização.
Para mim, uma folha que cai do topo de uma cachoeira é motivo suficiente para me comover. E para me encher de beleza.


Marina Cangussu F. Salomão

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