segunda-feira, 26 de maio de 2014

Tua volta (para tua casa)

Estou procurando teu cheiro
Este derretido de suor e perfume
E outro algo teu específico

Estou procurando tua bagunça
Tuas coisas espalhadas e amarrotadas
Algo teu esquecido

Estou procurando teu barulho
Aquele que me irrita, me faz graça e me consola
Ou o que me faz perder-me

E me dou conta que meu espaço é vazio
Que sem teu colo é tudo frio. Insosso
Impercebido na palidez das cores

Marina Cangussu F. Salomão

Corpos

Andam algumas coisas desandadas
Outras por dar pé
Andam, correndo
Incomodando-me seu sem nome
Sem face, sem corpo, sem pé nem cabeça

Marina Cangussu F. Salomão

domingo, 11 de maio de 2014

Janelas

As casas na porta da rua
Fazem meninos espiarem janelas
Fazem banheiros no quintal de lua
Fazem vizinhos mostrarem banguelas
Fazem namorados todos pela rua
Fazem histórias contadas por elas
Fazem a graça andar nua

Marina Cangussu F. Salomão

Por dentro das paredes

As casas
Soleiras transviadas
Sobrando rincão
Mesas cadeiras
Geladeiras recheadas
Muito menos que o vão
Os passos
As rimas
Cantigas soltas pelas águas
As flores meninas
Cortinas
Todas floreadas

Marina Cangussu F. Salomão

Partir

Há coisas a se fazer antes da partida
Mesmo que tenha volta
Entre tantas chegadas
Há de se ir e se finalizar
E redundantemente,
Nos clichês e nas rimas,
Há de se abraçar, há de se dizer
Deve-se amar, deve-se sofrer
E acima de tudo
Há de se falar o que anda guardado no peito

Marina Cangussu F. Salomão

Fetiche

E te vistas de louco
Macho e carrancudo
E te faças de posudo
Dê-me até um tiro
Que não me tirarás sequer suspiro

Mas te coloques a postos
Na beirada de qualquer canto
De poeta ou de santo
Solto, revolucionário
Que nem precisarás esforços com a boca
Porque te arrancarei a roupa
Até mesmo dentro do armário
Marina Cangussu F. Salomão

Salto

Que demasiado!
Que demasiado!
Um salto vazio e vago.
E que belo fosse a vida
Como esse salto:
Um passo traz o outro
No impulso
Como um deus
Em poder e força
E um vento
E um tempo
Sem vazão
E a vida sem ser em vão.
Demasiado!
Arrematado
Com próprios detalhes.

Marina Cangussu F. Salomão

Meu Querer

Eu quero me enrolar em você
Até perder meus pedaços
Nesse labirinto de traços.

E tudo aquarela e lilás
Você de perfil e sagaz
Em meu quadrado de chão.

E tudo risco e traços
Nós dois apenas mormaços
De tantos rabiscos na mão.

Eu quero perder meu desenho
Eu quero saber que eu te tenho
Assim doce vazio e em vão.

Marina Cangussu F. Salomão

Poema do corriqueiro

É uma dor que se parte
E se reparte
A da partida:
Fica metade
A outra se finda

Marina Cangussu F. Salomão

Conversa na estrada

O tempo parou
No regaço do chão frio
No mormaço do alivio
No sonido do bafo
No esquentar do próprio aço

Mas asas (?) sempre voaram
No alto, no raso, no profundo e no eterno
E mesmo em correntes
Em brasas quentes
Em óculos sem lentes

Como estiver o canto mais profundo
Como for o oceano mais fundo
O grito insistente do passageiro
Sempre busca, escondido, o seu mundo


Eduardo Cardoso Araújo e Marina Cangussu F. Salomão

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Boneca

Ela era boba demasiado
Ela era inanimado, assim perdida: engraçado
Tinha alguns defeitos incrédulos de se soltar
Depois voltava a se prender e a voar
Ela era flutuante, inconstante e despreocupada
Tinha uns ataques de fazer e refazer
Depois voltava a aquietar
Era descrente, sorridente e anonimata
Aparecia de rosa fluorescente
Depois voltava a embejar
Ela era real afinal
Mesmo que depois ela voltava a deixar de ser-se

Marina Cangussu F. Salomão