segunda-feira, 30 de maio de 2011

Apócrino

Não sou poeta rico em sinfonias
Apenas dissolvo-me em palavras
Difusas que se contornam e
Associadas constroem sentidos
Repletos de valsas soltas
Não lúcidas e inteligíveis
Que se sentidas tocam sonetos
Em allegro e dó
Dor repetida que translada
Vigentes quimeras de pouca luz
E translúcida arqueja desejos
Que notados seriam se não negados
Mas herméticos borbulham.


Marina Cangussu F. Salomão



Transtorno

Os motivos difusos de seus sentidos
Transtornavam sua razão sagaz
E mais bobo e medíocre
Contornava rotas sem temê-las
E já distante em nau perdida
Voltaria para ter finitude
Não que seus sonhos morressem
Seriam transversos ao ludibriado
E mais romântico e tão racional
Se construiria a David
Em matronas descoradas e reais
Assim sentaria e choraria o almejado


Marina Cangussu F. Salomão

Fantasmas

E diziam, barulhando em seu ouvido
Os fantasmas que existiam
Que dobravam-se e confrontavam-se
Até que ela passou a senti-los
E não haveria claro com suas sombras
Rondando, gargalhando, resumindo a destroços
Apenas seu mundo mágico
Defendia-a do trágico destino de fantasmas
Soltos, maus e cruéis
Que entorpeciam e redriblavam
Sós em seu mundo sem tato e sensações.


Marina Cangussu F. Salomão

Formigueiro


Eternidade etérea latejante
Em meio ao formigueiro:
Opróbrio que reluta na
Quimera alucinante de ser pleno

Retumbem em ideias avis e desesperadas
Mas seus corações estão muito além
Apodoados pelo que não se vê

Diversos e insignificados
São iguais em lacerante delírio
Apanágio de formigas em construção:
A labuta que desperta o dispersante

Buscam sufocantemente pela superfície
Deveras rastejam entre as fontes
Mas o que alcançam não alivia o soluçante

Tentam-se magos, acrobatas de passeio
São apenas dândis, corrupião dançarino.
Fazem-se etéreos e pensam-se eternos
Mas são somente agnatos feiticeiros.


Marina Cangussu F. Salomão

Alma blasé

 Para Cardoso A.

Preciso de tua alma na minha
Para que esta alma latente
Lateje completa na tua


Alma pobre vivendo estática
Insípida sem movimento
Ignorando sua incompletude


Mas ao sentir a presença da tua
Minha alma morta revive
Sedenta por embeber-se cabal


E insegura ao ver tua alma distante
Sussurra em temores e louca
Para completar-se volúpia


Não pouco magnética se atira
E não mais latente revive
Revigora-se como alma completa.
Marina Cangussu F. Salomão

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Suru

Cantarolaram imensamente ararinhas pela janela
Doce e terno como seu olhar fajuto de cético
Arraigando-se pela destreza da automentira
Desenha-se forte, lógico e imprudente
Mas menos astuto que o barulhar frágil
Das donzelas arpejantes num céu sem lua
Virgem de poder incapaz de ser-se
Apenas pelo medo dos fortes maganos desequilibrados
Ah! Garça real, voe sincera em teus deslizes
E verás quão rijo é a rajada por tuas delicadas penas.


Marina Cangussu F. Salomão

terça-feira, 24 de maio de 2011

Apócrifo

No instante que as últimas mágoas me escorreram
Desfez-se os limites que outrora me rodeavam
Controlando gestos, gostos e desprazeres
Invadiu-me, então, um mundo de sensações livres
E tudo ficou claro e fez-se intenso
Não leve, pesava-me a negligência
Soturno deleite memorável
Agora sinto contornar-me defeito
Mesenquima daquele cheiro
Que gritava forçosamente em delírios
Não pobre de vontades, nem rico de repressões
Astucioso na emblemática face
Cria-me divergências entre o saber
E já quente e completo: apocrífa-se.


Marina Cangussu F. Salomão

domingo, 22 de maio de 2011

Contra

A felicidade bestializou-me
A ponto de criar-me medo
Da fugaz ideia de mudança
Desvinculação de sentido
E tudo tão limpo e seguro
Se desdobra em apertos
Olhares e humano
Vontade de abraçar tudo
E segurar forte contra o peito
Contra a perda, contra o medo.


Marina Cangussu F. Salomão

Menos

Tu, que dizias sobre não ser menos
Destacavas os sonhos e prodígios
Tu, que chingavas os alossomais
Relutavas os afazeres, negavas perspicaz
Tu, que hoje dizes meu exagero,
Contemplando minha demência
Desmentindo o desespero
Foges se possível para tua linha
Não rompa minha égide fina
Ou aquebrante meu ser feiticeiro
Tu, és tu que não sabes o que quer
Eu: quando quero mais, quero menos.


Marina Cangussu F. Salomão

sábado, 21 de maio de 2011

Imprudente

E mesmo que não importe
Há uma relutância sussurrando
Desesperadamente: razão, razão!
Talvez no girar veloz e feliz
Ela escapasse tangencialmente
E de tanto que havia para admirar
Nem notasse sua fuga
Sorrateira e indiferente
Mesmo agora, diante dos motivos
E de tantas histórias proclamadas
Fosse necessário senti-la
Mas prefere-se voar e sorrir.


Marina Cangussu F. Salomão

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Vaga aspiração

Ele não flui além dela
Nem existe além de seus desejos
Agora perto ou longe
Nada varia no firmamento nefelibata
Diante das alterações borbulhantes 
Que outrora lhe atingira
E desfeitas escadas ou alcances
Nada percebe ou toca sua mente
E sua alma desenvolve leve
No doce aspirar flutuante
Do seu céu de nuvens brancas
E dele nada parte ou abandona.


Marina Cangussu F. Salomão

terça-feira, 17 de maio de 2011

Formigas relutantes

Neste momento em que já não fluo em sua presença
Sinto-te vago em mim
E nada retumbe ou dilacera
Pelo contrário, volto a notar as formigas.
Não que seja etéreo, mas também pouco relutante
Não precipita-me tua ausência
Ou a memória de suas palavras
Perdoe-me a sensatez realizada na frialdade
Talvez as formigas clamem melhor por meu olhar.


Marina Cangussu F. Salomão

domingo, 15 de maio de 2011

Vertigem

As palavras proibidas aos meus lábios
Rodopiam em minha mente
Dançando soltas e ferozes por amplificarem-se
Desejam um campo grande de ação
Sonham com ouvintes dedicados
Mas o que elas professam são apenas vertigens
Originadas em um sonho longínquo
E mesmo que elas se encaixem
Entre o desejo e a vontade
Ressoam aéreas no pensar exposto
E chicoteadas seriam no falar alheio.


Marina Cangussu F. Salomão

Meu

Olho as paredes erguidas e vazias,
Nada é capaz de preenchê-las.
Por minha face rolam águas arrependidas
Por não aceitarem a sensatez do ódio
E não repudiarem a violência do amor.
Sentimento que transborda lembranças,
Que rememorizam-se e se revoltam em mim.
Pesando em cada fragmento de meu corpo 
Marcado pelos pronomes primários plurais.
E de tão intensos rebentam-me contra a parede
Vazia. Inóspita. E ausente.


Marina Cangussu F. Salomão

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Poesia intradutível

Como poesia intradutível
É esta dor que não me parte
Não me abandona, apenas me desfaz
E a falta que a tangencia se aprofunda
Me mergulha, me afoga
Cansa-me por debater
E preenchendo-a, preenchendo-a
Nunca transborda
Ao contrario, se afunda. Intensifica
Sinto tracionar minhas sensações
Girando e puxando lentamente
Até se romperem em um rio
Caudaloso de correnteza forte
Que novamente me afoga no vazio
A respiração se dificulta
Tudo fica seco e crespo
Então posso tocar meu vácuo deserto


Marina Cangussu F. Salomão

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Ausência

Ausência é esta com frequência desordenada
Que desmantela as expressões forjadas
Às vezes molha a face ou apenas decai o olhar
Mas recheia-se de memórias afetuosas
Saudosa do antes e das intraduzíveis sensações remotas
Ausência é esta que aperta, que reveste
Engloba toda encenação e personifica a realidade
Idealiza opróbrios e qualifica mazelas
Pelo simples fato de preencherem a alma
A ausência é esta que dói e inescreve-se


Marina Cangussu F. Salomão

Antes

O antes sempre deixa saudades:
Os recados memorizados transbordam afeto
As palavras doces e os sorrisos.


O antes sempre guarda vontades:
As memórias segredam tristezas confortadas
Abraços do sincero e da felicidade


Do antes se esquece as mazelas
Se desfaz o ruidoso e se ouve canções
O antes, então, deixa saudades.


Marina Cangussu F. Salomão

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Dourada púrpura

As tardes melancólicas sempre remetem-me
Àquela tarde de céu dourado
Salpicado de púrpura quase rosa
Aquele sentimento que inundou-me e aquietou-se
Se revolta diante dessa lembrança
E não encontro explicação para a reincidência
Muito menos para aquele instante
Sei apenas que sentia muito mais do que sinto
Então penso se essa revolta sentimental
Não é apenas a voz dizendo:
Ainda há lúcido. Ainda há asas.


Marina Cangussu F. Salomão

Partir

Não compreendo este medo
Que aflige-me quando dou meus passos
Talvez o sentimento se refira aos meus
Então tudo se resolveria:
Afinal conheço o sofrimento
Que parte de meus pronomes
Porém, a realidade projeta-se
E os passos se tornam menos coesivos
As pernas tremulam
E o pisar é falso
Pois nunca volto quando quero.


Marina Cangussu F. Salomão

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Infinita hora da Esperança

Sinto minha inspiração palpitante
E recobro-me de pensamentos ladeados 
Que hoje podem voar pela lembrança da liberdade.
E unido perfaz-me uma imensa sensação:
Saudade misteriosa do lugar de onde vim.
Lugar etéreo como o doce momento de adoração.
Neste tempo decido que se não houver além
Fico mesmo no valor do passado.
E não importa quantas notas tocarão
Até que se perceba quão considerável é o instante,
Contanto que se repare que aquém também vale.
Assim meus sentidos apreendem a infinita hora da Esperança.
Ich habe Diamanten und Perlen,
was will ich mehr?


Marina Cangussu F. Salomão

terça-feira, 3 de maio de 2011

Cíngulo

Ouço-te como voz exorante
Gritando, clamando por mim
E diante de ti minha importância vã
Se torna eterna e essência
E apenas a isto se apega e se ama
Caritas. Caritas. Caritas.


Então vejo-te forte e cheio de glória
Mas paradoxalmente humilde
Me sorri, me encanta, me transporta
Agora longe sinto o borbulhar se desfazer
Sonora, sonolenta e sagaz
Faz-se tuas construções em mim


Edificante sinto-te cingir-me de ti
E por vez reparo minhas  virtudes se esvaindo
Em troca abre-se espaço para tua habitação
E caritas, caritas transbordas em mim.


Marina Cangussu F. Salomão