quarta-feira, 25 de julho de 2012

Reis

Altar tão frágil
Que desmorona
Ao simples vento
Do sussurrar 
De uma canção


Marina Cangussu F. Salomão

A fuga pela arte

Olhei e chorei meu passado
Onde encontrei meu perdão


Que ele se faça ser
Para permitir eu-avião


E não me sobre culpa circulante
Presa a qualquer chão


Mas que eu vá rasante
Na arte deste acordeão


Marina Cangussu F. Salomão

sábado, 21 de julho de 2012

O vento no morro

Via tudo se desmoronando 
Vagarosamente
Como um barranco
A perder grãos
E por vezes
Pequenas pedras
De composição.
Assim via,
Cada pedra se soltar
E rumar-se
Para qualquer outro lugar
Que não o desenho
Guardado entre os passados
Do que era seu.
Era capaz de ver
Até aquele vento
Se aproximando
Ainda longe
Para levar de um sopro
Tanta areia e tanta terra.
E já via a poeira
Sendo levada
Como simples insignificado
Para tão distante
Que suas mãos
Não alcançavam
Nem no maior esforço e berro
De se rasgar
Partir e perder
Mais solo
Para ter de volta
O que não segurara
Não molhara
Para ter mais liga
E ficar mais próximo.




Marina Cangussu F. Salomão

A busca

Hoje vemos como em espelho,
De maneira confusa. 
Amanhã veremos face a face.
Angustia humana 
De compreender todas as coisas
Imensas ou não
Tê-las nas mãos
Com sorriso materno
Cheirando a compreensão
E sentir o desinflar
Do que incha e consome
Desarruma, embaraça
Pela busca de algo
Que também não se sabe
Nem se nota, nem se vê
Mas que cresce
A cada frigir de cílios
E movimentar de olhos
Comprimindo os pulmões
Abafando completamente
A pequena existência
Para que seja incessável
A busca pelo conhecimento
De todos os mistérios
E de todas as línguas
De tudo o que rodeia
E consome a alma.

Marina Cangussu F. Salomão

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Narguilé

Como fujo de ti e de teus toques
Para ingressar-me em sei lá que pés
Perdida sem trechos ou trilhos
A sós sem nós
Se minha poesia insiste em bater
Vagarosamente em teus detalhes
E sem saber porquê
Retorno feliz sem encalhes


Marina Cangussu F. Salomão

Companhias

Preferia a companhia dos mudos
Ao julgamento dos olhos
mesmo que se formasse suave
Extremamente agradável
E desejado a outros ouvidos
Mas temia que dissessem 
E se espalhassem no dizer
Professando o efêmero de si
Pois ao dito deve-se permanecer
E era tão mutável
Que um dia não seriam
As palavras de antes
Como antes não foram
As palavras de hoje
E sofreria o desejo
Como sofrera anteriormente
Por isso preferia a companhia
Dos cegos de olhos
E livres de coração
Já que o eterno não muda
Nem a essência passa
Mas prolifera
Conforme regada


Marina Cangussu F. Salomão

Helena

Porque a angústia
Invadia-lhe tanto
Com intensidade venérea
Apenas por ser 
(E era!)
A mais bela.
Radiante em si
Em seu sorriso
Bela
Com todo seu peso
Toda a dor de sê-lo
E seu perigo
desprotegida
Angustiada
Incomodada

Mas Bela
Por ser
Por nascer
E se tornar
Não diria e não cria
E hoje se via
Todos viam
Então temia o peso
De ser tanto
Sem treino
Ou imaginação
Apenas jogada em público
Para ser
Temerosa
O que era
Marina Cangussu F. Salomão

Para lá

Explode-me uma vontade imensa
De rasgar o que me prende
Me aterroriza e abafa
Despregá-lo de minhas asas
E poder movê-las por primazia
Para ver o que me espera
O que me chama já rouco
Lá, bem longe,
Nas terras do sem-fim


Marina Cangussu F. Salomão

A sentença

Sabes que algo me ampara
Na amargura que me destes
E no meu mistério revira-se
Temente de minha sentença
Mas não te aflijas comigo
Não tenho poderes nem voz
Contra ti, só contra teu amor.


Marina Cangussu F. Salomão

Atoleimado

Há um grito em minha garganta
Pronto para julgá-los e surrá-los
Até que me reconstruam
E me voltem novamente à plenitude.


Mas nada volta ou retorna 
Em decadência tola
A menos que me redima e subjugue
Na fé parva de minha crença.


Mas meu grito nega a proclamação
Da vitória do sofrimento 
Contrária a toda iluminação
Reflexa de minhas qualidades.


Marina Cangussu F. Salomão

Sintomas

Sinto teu cheiro ululando em minhas narinas
Como se tua alma roubasse todo o ar 
Que te rodeia para manter-me tua.
Ainda que esquece-se o corpo em cadáver
Para lembrar-me da esperança colhida de estarmos juntos.
E alcança seu desejo, porque volto inebriada em aspiração 
Seja para onde me caminhes ,
Conquanto me nutra e absorva de sonho
De confabulação cega por teu encontro.


Marina Cangussu F. Salomão

Fé desfeita

Hoje conheço a fé dos incrédulos:
Os terrenos, os etéreos.
Vejo-a salpicar por entre costumes,
Entre olhos e apuros.
Mas não se distorce em aspersão,
Nem vontades, nem brilhos.
Existe na decadência e na possessão,
Na desesperança e na visão.
Existe no saber de si.
Na humanização.


Marina Cangussu F. Salomão

Psykhé

E dir-se que seria livre
Para as palavras em ordem
Que vêm não se sabe donde
Invadirem a caixa
Misteriosa e complexa,
Para movê-la com maior rapidez
Naquela estrada de tijolos amarelos.


Marina Cangussu F. Salomão

Olhos

Tudo mais claro e completo
Diante daqueles olhos 
Pouco claros e muito densos
Meio puxados, fechados
Que olham com imenso afeto
E pouco curioso.
Os mesmo olhos que protegem 
Com prolongados abraços
Mas nunca com palavras
Pois elas não são de sua boca.
Os olhos tardios e doces
Que se ama, se beija e se ri.


Marina Cangussu F. Salomão

segunda-feira, 9 de julho de 2012

O Amor

Só compreenderia a plenitude
Naquele momento
Que o amor retornava
Unido às suas angustias,
Que transtornavam-na a face
Em dizer de dir-se-ia.
E no momento
Era incapaz de desenhar
As letras de um mal dizer
Ou de uma insatisfação:
Pois que importa junto da amplitude
De sentir-se quente feliz?


Marina Cangussu F. Salomão

segunda-feira, 2 de julho de 2012

A perda dos apressados

Quem me dera ser como estes
A sentar pelos bancos
Para conversar,
Olhar,
Contemplar.
E assim ver-se indo
Sem domínio ou tempo!
_Ou dominaria mais
O girar da sombra dos apressados,
Mais que os próprios rápidos
Que não se veem.
E quem me dera um dia,
Com meus grisalhos pelo vento,
Poder sentir o suor daqueles
Que hoje não vejo por ser eu.
E descrevê-los
Lentamente
Em pressa
E em perda.


Marina Cangussu F. Salomão

domingo, 1 de julho de 2012

Vindicar

Minha esperança oscila em um fio
Como redenção girando lenta
Pronta a espatifar-se
Espalhando por toda parte a desilusão
O desastre de se contornar
E girar em volta de si
Repetindo, repetindo
Durante tempos
Os mesmos cenários e desculpas
E a cada girar de anos
Desfez a linha que a segurava
Transformando-a em fio
Que rebenta e lança
E voa livre, para longe
Até alcançar o chão em velocidade


Marina Cangussu F. Salomão