quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

No casulo


Cada um faz seu caminho
Em pedras coloridas, como queiram

E torcem e distorcem
Convertem e divertem
Quebram e requebram

Seus retratos e passados
Suas esperas e o que esperam
Seus motivos e motivados

Cada um vai se entorteando
Ensimesmando
Escarafunchando

Até abrir-se formado.

Marina Cangussu F. Salomão

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Olhos altivos no chão


Sustentavam-se de seus castelos derrocados
Destruídos em amarelo cinza cor de terra
E iam rastejando altivos em sua poeira árida
Lambendo todo o pó na ânsia de ser ouro

Revestiam-se daquela ilusão contentados com o desenlace
E o único que erguiam da imobilidade eram os olhos
Para não ver o chão tão perto e tão podre
Sob seu rastro de perfeita hipocrisia

Marina Cangussu F. Salomão

Lembrança


Sinto-me tão apertada neste cubículo de paredes
Que um simples olfato familiar fragiliza-me
E contorce toda a minha efigie, retraída por tocar
E produzir o mais lindo som em lágrimas de notas
Claras e pulsantes, rodopiantes entre as lembranças mais nobres.

Marina Cangussu F. Salomão

Meu castelo


Há poucos anos, após se desfazerem todos os castelos pré-construídos e moldados que me deram e sustentaram, questionei ao alto quando voltariam as preces sem pressas e as graças, quando voltaria o sincero.
Sobrou-me apenas paciência.
O tempo, então, resolveu-se por soar lento, vagaroso, em cada suor e em cada choro.
E após mil quatrocentos e sessenta e um dias, sentindo cada um pesar-me tenramente, contando cada um de seus segundos, vi que passaram ligeiros, rápidos. E que me deixaram seus mil turbilhões, e estes me ergueram junto do vento e lá em cima criei asas, bem grandes e redondas, que quando me guardavam, de longe, era o mais lindo castelo.

Marina Cangussu F. Salomão

Voou


Hoje me permito voo rasante
Sem paradeiros
Sem pressas
E sem medo
Só sonho e recheios
Só asas.

Marina Cangussu F. Salomão

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Imensidões


 O todo se faz pequeno 
Na imensidão do colorido daqui de baixo
E rodam e giram embriagados de tanta luz 
E tanto que se deve ver
E perdem na imensidão de cima 
O tanto que se devem ser

Marina Cangussu F. Salomão

Linha de imaginação


Iam no segmento repetitivo
De imitar os mesmos gestos
Em mesma linha de andamento

Formados nos pacotes coloridos
De idênticas cores e laços
Embrulhados em prateleiras

Iam com a mesma função
A mesma repetição
Competir diferentes arranjos

Inventavam poucos detalhes
Recheavam com sons avulsos
Aproximavam em pura rivalidade

...Eram bonecos sonhando a própria compra

Marina Cangussu F. Salomão

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Supracitação

Não canto em canto escuro
Nem falo só calo
Em incontestáveis contáveis
Solos em solo seco
Na árida terra molhada
Por meu choro em coro
Dos poetas largados
De meu chão alaranjado

Marina Cangussu F. Salomão

Cantos

Hoje me calo em silêncio aterrorizado
E não há canto em qualquer parte
Nem sol nem voz nem abençoado

Há desleixos em insuportáveis cantos
Em gretas buracos diachos

Marina Cangussu F. Salomão

Sentimentos nos velhos quartos

As memórias falham no estar novamente
E as cenas se desenham todas em terceira pessoa
Pessoas estranhas e tristes em fantasmas
Incapazes de tocar em suas águas e horrores.

Marina Cangussu F. Salomão

Solo

Quem poderia dizer para onde vai a vida
E o que vamos ser
E se os caminhos onde damos os passos
São os mesmos onde construímos nossos castelos
Diga-me: onde tudo isso pára
Já que nem me reconhecem em fotos antigas:
Meu rosto muda, meu corpo muda,
Minha alma muda, quiçá minha essência.

Marina Cangussu F. Salomão

Cético

Disfarça-se em incredulidade
No tontear de falta de risos,
Falta de turbulências,
Falta de vocais.
E gira e roda, tonteia
No fingir de não ser os olhos
Que remexem para lados
Ou a mente desenhada na cabeça.
Apenas julga o mundo passando em círculos
Impondo o movimento da terra
Registrados nos teóricos.
E esquece seu próprio movimento.
E não mais se mexe
Nem retira os pés
No medo da pouca fé
De caminhar.

Marina Cangussu F. Salomão

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Meu desejo

Somente quero estar lá:
Por trás da cortina enevoada 
Sentindo o cheiro molhado
Que a terra transpira.
Somente ela e minha contemplação
Em horas monótonas e vazias
Que preenchem meu espaço
Em sussurros e balanços.

Marina Cangussu F. Salomão

Síndrome

O tempo não para em seu cubículo abarrotado
Nem os olhos cerram.

Os pensamentos tolhem
Em seus quilômetros de listas e tantos defeitos.

A garganta entope,
Os lábios embatucam.

E os grandes olhos procuram pela vida.

Marina Cangussu F. Salomão

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Transparentes

Os transparentes
Que passam em suspiros
Mal notados
Escondidos nos cantos
Passavam estranhos 
Do outro lado dos olhos 
Que não olhavam
Passavam sumidos
Calados
Sem corpos
Inconcebíveis
Em transitório devanear de anônimos
E iam para incontestáveis lados disfarçados
Assombrados
Em malas, pernas e sapatos.

Marina Cangussu F. Salomão

Meus olhos

Olhavam para cima 
E giravam em perfeita circunferência
Repetidamente
Iam no meio e voltavam ao centro
Procuravam os motivos
Os suspiros e a saída
Mas não viam, nem sabiam, nem notavam
Eram cegos.

Marina Cangussu F. Salomão

Buzinas e gemidos

Eles nos matam aos poucos
Consumindo nosso ócio 
Em mil gritos aturdidos
De tantas buzinas e gemidos.
E consomem a alma etérea:
Aquela diminuta alma sem ar
Sufocada em seus barulhos 
E nos tantos deveres,
Que retira o que é capaz
E desenha nos corpos os traços a ser,
Lineares e delimitados.

Marina Cangussu F. Salomão