segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Ele

Ele tem os olhos negros
Assim como vulcões
Desses vulcões que parecem dormentes
Mas estão por erodir

Ele também é erudito
Assim com vários livros na estante
Que antes, nas mãos
Estão prontos para serem relidos

E ele sempre me reler
Sabe de meus dias carcomidos
E mais ainda dos de regozijo
Esses onde estamos prontos para nos perder

E ele nunca me perde. 

Marina Cangussu F. Salomão

Governos

Ele é controlador, eu diria.
Controla o que fala, o que come, o que sente.
Controla o que o rosto expressa, as horas de sono, a própria mente.
Ele inclusive tem um caderninho de controles:
Anota gastos, dinheiros e alguns amores.
Controla passos e quilometragens. Calcula tempos.
Ele tem tudo sob controle:
Nunca nenhum excesso
Nem nenhum acesso
Tudo com sucesso controlado.
Acho que ele esconde um auto-manual de como proceder.
Ele controla até a respiração. 
Ele foca toda a atenção.
Controla a fome, a sede.
Acho que ele também controla desejos.
Controla tesão.
E ele me controla nessa situação:
E eu, tola, sou todinha dele, desgovernada.


Marina Cangussu F. Salomão

O ano

O mundo vai mudando a gente

De lugar
De formato
De aspecto
De anonimato

Vai virando
Mastigando
Transladando
Detalhando

Juntando retalhos

Marina Cangussu F. Salomão


Golpe de estado

E o dia continuou igual:

Acordei. Lavei o cabelo. Passei na farmácia. Segui para a aula. Almocei. Fui para o trabalho. Reunião a noite. Liguei para os meus pais. Conversei com o vizinho, o cachorro dele me latiu. Liguei a TV, que falava da separação de um casal famoso. Dormi.

Mesmo o que é brusco vem devagar. Para nenhum bobo desconfiar.

Marina Cangussu F. Salomão