E quando todos os carros param repentinamente na deserta e anoitecida rua, nada ressoa a não ser as velhas e desgastadas presilhas da sandália. O solado por um fio de cola representa o quanto já andara.
Não é a brisa noturna que lhe seca o suor: talvez o sonho - o monstro de ilusões que criara. (...)
Deixara para trás tantas canelas arrouxeadas pela bola, eram apenas meninos na tentativa incerta de terem enganadamente descobertos seus desejados talentos ou quem sabe o desejo desesperado de se libertarem do futuro preconceituado do morro.
Por outro lado, exatamente do outro lado da rua, haviam aquelas meninas de meia-calça preta, recheadas de maquiagem. Longe flutuava a discussão sociológica, porque problemas mais urgentes eram corriqueiros: o embelezamento excessivo e desnecessário do que há de mais vã: a carne.
Carne que morre, apodrece, fede e se torna sal para, quem sabe uma árvore - que nem imagina que seu destino é sofrer cortes profundos no lenho, que a transforme em um toco no chão onde muitos irão tropeçar - trabalhe forçosamente para fazer-se frondosa afim de ampliar o sol em seus pigmentos.
(...) Nenhum homem a olha nem a deseja, ou está cansada demais para despender energia com desejos ínfimos que demonstram somente como do pó somos e demasiado voltaremos a ser. Ah! Não pode negar, é o único prazer que este mundo lhe pode oferecer. Mundo, tão devasso mundo.
Marina Cangussu F. Salomão
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