domingo, 18 de dezembro de 2011

Controle remoto

Já não aguentava mais. 
Aquela confusão a sufocava.
Por que não poderia ter os dois?
Por que não poderia ter tudo aquilo que desejava?

  Sentia a respiração exigir-lhe mais e o coração avisava-lhe, desesperado a bater, que não suportaria, clamava pelo ar. Porém o ar rarefecia-se, tornava-se longe e difícil. Estava perdida.
  Morreria. Não havia onde sugar todo o ar que necessitava para manter-se viva, para controlar-se, controlar o desespero de seu coração.
  Morreria. 
  Mas talvez fosse melhor assim: chorariam por ela e por sua ausência, sofreriam essa ausência e ela os faria esquecer seus erros e suas faltas. Esqueceriam que deveria escolher e também perderiam na memória santificada de sua imagem em saudade o erro de sua escolha. Assim bem melhor. Morreria e seria absolvida de seus pecados, absolvida da condenação de escolher.
  Mas seu coração permanecia apressado, avisando-a que ainda não morreria e implorando pelo ar com a urgência que não gostaria que lhe exigisse. Precisava de tempo. Precisava de muito tempo. Mas se o desse perderia as alternativas: e não haveria escolha, mas também não haveria nada.
  E não poderia haver nada: Se abdicar-se de um já a enlouquecia, imagina perder os dois. Não. Não sobreviveria à miséria do nada diante de seus esforços e de suas dores, diante da loucura de desejá-los como parte de si.
  Como se cada um fosse um pulmão.
  Não poderia dar-se ao luxo de perder sequer parte, sequer segmento pulmonar. Pois é como um câncer: necessita de muita energia, de muito ar, de muito sangue nobre contaminado pelas alternativas. E um câncer não pode perder sua fonte, não pode perder seus pulmões.
  E por que não poderia ter os dois? Por que lhe condenavam à escolha?
  Bem sabia que suas vontades eram divergentes. Completamente opostas. E nem infinitamente suas retas se cruzariam. Nada as intercedia.
  Talvez isso que a sufocava: esse desejo pela impossibilidade. 
  Achava tão atraente sua união. Tão desejável! Delicadamente incerto e desequilibrado.
  Louco.
  E a loucura sempre a atraía tanto... Lhe persuadia suavemente a gostar de sua insanidade. A entregar-se ao seu mundo mais torto e mais fantástico: com tantas cores e de repente negro, sombrio e desesperador. A consumir-lhe a calma, a linha, o certo e o bem. A consumir-lhe a respiração, sufocante de tanto medo da razão, que impunha-lhe certeza e padrão, e retirava-lhe a loucura.
  A loucura que teimava em explodir e ousava-se a fragilizar os muros que a segurava a cada batida daquele coração desesperado.
  A loucura que a atraía e explicava porque a cada dia lhe aparecia uma desconhecida cada vez mais atraente no reflexo de seu espelho. E era tão atraente que sua permissividade aumentava: e ela poderia tudo. Poderia ter o que quisesse... Poderia ter os dois.
  Não escolheria.

Marina Cangussu F. Salomão


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